Inunda meus olhos

“Elas, as luzes, vêm com a euforia das compras e num espetáculo de beleza recebe, democrática, todos os transeuntes, empetecados ou não, endinheirados ou não. Oferecem-se aos olhos guirlandas dando claridade aos prédios e postes, noite iluminada essa que inunda meus olhos, sem pedir licença, e me leva a contemplá-la como um rastro de Via Láctea. Tenho sede de luzes e é no final de ano que me abasteço delas, sem saber ao certo com qual serventia.

Há algumas semanas a decoração de Natal fora instalada nas principais ruas comerciais. A grande avenida teve suas árvores decoradas com luzes até onde a vista se perde. O pinheiro de adornos mais reluzentes foi montado na entrada da prefeitura. Aguardava com ansiedade acenderem-se no momento em que a escuridão dá seus primeiros sinais e, da minha janela redonda, das coisas que existem e que não existem, era embebida um halo verde e branco.

Em outra avenida há um onda branca e volumosa acima de nós, combinada com uma chuva vermelha de luzes. Elas acendem e se apagam, dançantes. Outra árvore, solitária, imita neve caindo. Na praça a nudez dos galhos se reveste com folhas artificiais iluminadas e bolas vermelhas que mais parecem maçãs. E onde dormem os passarinhos nesta profusão luzidia? Não durmo eu nesta cidade iluminada, que me mantém acordada, pensamento aceso.

Fantasio outras ruas extemporâneas, com olhos biônicos de câmera de vigilância. Quero adornar os lugares já visitados, numa inútil tentativa de rever as possibilidades do que já foi descarrilado. Monitoro vidas paralelas a essa, porque o tempo nesta janela é o do pensamento, corre na velocidade das nuvens e nunca se reconfigura como da primeira vez.”
Elisa Andrade Buzzo, Digestivo Cultural
Artigo Completo, ::Aqui::

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