10 palavrões 1 livro didático e ninguém no governo

Diogo Salles, Digestivo Cultural

"O time está perdendo o campeonato. Precisa desesperadamente de um gol para levar a decisão para os pênaltis. O adversário faz cera, gasta o tempo, catimba o quanto pode. O time está cada vez mais nervoso, afobado. Os laterais nem se preocupam mais em chegar à linha de fundo. Cruzam bolas e mais bolas na área em busca de um cabeceio salvador. Já estamos nos descontos e o craque do time insiste em prender a bola, em fazer firulas e mostrar por que ele é titular da seleção brasileira. O técnico precisa tomar uma atitude. O que ele faz?

1) Anda calmamente até a beirada do campo e pede, pausada e educadamente ao jogador: "Desculpe incomodar, mas gostaria de pedir ao senhor que passe a bola ao seu companheiro mais bem-colocado. Muito obrigado".

2) Corre até a beira do gramado (quase invadindo o campo) e berra: "Caralho! Passa a bola, seu fominha filho da puta!"

Não há registros de que tenha existido alguém tão obsequioso como esse técnico imaginário da opção 1. E olha que, no futebol (especialmente no brasileiro), já aconteceu de tudo. Gandulas invadindo o campo e impedindo gols do adversário, jogador recebendo dois cartões amarelos no mesmo jogo, teve até juiz fazendo gol... Não dá pra imaginar que qualquer boleiro ou torcedor jamais tenha ouvido (ou dito) um palavrão num jogo. Quem nunca mandou o bandeirinha tomar no cú por causa daquele impedimento mal-marcado? É por isso que as mães dos árbitros se tornaram as figuras mais lembradas dentro de um estádio. Quem já foi a um jogo sabe muito bem do que estou falando: o palavrão, no calor jogo, é inevitável.

Causou polêmica aqui em São Paulo a atitude da Secretaria de Educação do Estado de distribuir, para alunos da 3ª série, o livro Dez na área, um na banheira e ninguém no gol (Via Lettera, 2002, 112 págs.). O livro é uma compilação de HQs (histórias em quadrinhos) e foi organizado por Orlando Pedroso, ilustrador da Folha de S. Paulo. Lançado às vésperas da Copa de 2002, contou com cartunistas premiados como Allan Sieber, Spacca, Osvaldo, Custódio, Fábio Moon e Gabriel Bá. Com um timaço desses, era improvável que o livro se tornasse uma cartilha politicamente correta ― ainda bem.

Curioso é que, já no prefácio, o ex-craque e atual cronista Tostão deixa a dúvida no ar: "Faltava uma obra como essa para crianças e adultos". Logo na primeira história, Lélis ambienta um clássico jogado no presídio. E não demoraria muito para acusarem o livro de "fazer apologia ao PCC". Mais para frente, Caco Galhardo satiriza as mesas redondas, misturando futebol com "piadas de conotação sexual", como foram classificadas. De fato, não é mesmo um livro adequado para crianças de 9 anos. Para o público adolescente, porém, é uma ótima leitura. Mas falemos disso mais tarde..."
Ilustração: Diogo Salles (Arte sobre capa)
Artigo Completo, ::Aqui::

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