Llosa: "Não represento nada, só a mim mesmo"

Terra Magazine / Revista Carátula

"Coisas da globalização. Javier Sancho Más - editor da revista literária digital centro-americana Carátula, uma feliz invenção digital do escritor Sergio Ramírez, nicaraguense - entrevistou em Madri, na Espanha, Mario Vargas Llosa, peruano, que está escrevendo um romance ambientado na África, mais especificamente no Congo, a respeito do irlandês Roger Casement, amigo de Joseph Conrad, romancista inglês nascido na Polônia.

Vargas Llosa (1936), autor de mais de trinta obras - a metade delas são romances - comenta questões do seu ofício e antecipa dicas sobre o romance no qual está concentrado. Terra Magazine publica um trecho dessa entrevista, cedido especialmente pela revista digital Carátula.

Nos últimos anos, com os acontecimentos na América Latina desde o surgimento de Hugo Chávez, você não deixou de desempenhar um papel de destaque como figura intelectual do continente. É impressionante o impacto que um artigo escrito por você pode ter, como o último que você escreveu sobre a situação da Nicarágua, aparentemente mais um, mas que originou muitas reações de grupos de mulheres contra Daniel Ortega. Você tem medo da responsabilidade que a sua figura implica do ponto de vista do jornalismo?
Olhe, Paul Válery disse algo assim: "Nada mata tanto um homem quanto ser o representante do seu país". Eu não represento nada nos meus artigos, só a mim mesmo. Escrevo a partir das minhas convicções. Não pertenço a um partido político, nem falo em nome de qualquer ideologia ou instituição. Posso errar. Sim. Com certeza erro muitas vezes, mas não tenho a pressão de ter que falar como porta-voz ou como representante de alguma instituição, comunidade ou país. Desde que comecei a escrever, sempre acreditei que a vocação literária não pode ser separada de um compromisso cívico.

Naquela época, falava-se do "compromisso do escritor" como algo aceito pela maioria. Eu me formei naquela época. Embora tenha mudado em muitos aspectos, não mudou a minha convicção de que o jornalismo é a minha forma de participar do debate cívico e político, defendendo e criticando certas coisas, ou para mostrar outros tipos de questões. Penso que essa relação entre a vida cotidiana é positiva para um escritor que não entende a literatura como um mundo isolado. Eu sou apaixonado pela literatura, a minha verdadeira vocação é a de ser escritor. Mas se há um aspecto que me comove na literatura, nos livros que admiro, é que esses livros me fazem ver o mundo no qual estou de uma forma mais clara.

Também há jovens escritores que participam do debate intelectual, lembro agora de alguns, como Jorge Volpi.
É verdade, alguns participam, mas não é a tendência do nosso tempo. Na minha opinião, os escritores olham com indiferença, até com desprezo toda essa relação política como se fosse prejudicial à vocação literária. É verdade que um compromisso exagerado com a atualidade pode ser perigoso, mas por outro lado, é daí que flui um tipo de vida que é positivo que seja retratada na literatura.

Eu pergunto isso mesmo, mas não do ponto de vista do jornalismo, mas sim literário. Você tem um status de celebridade mundial da literatura, está acima do prêmio Nobel (Mário ri). O mundo todo concorda que você é um dos maiores escritores vivos da literatura latino-americana.
Bom, não acredito nisso, porque no dia em que eu me convencer disso estarei perdido (diz, rindo).

Mas quando a crítica se torna mais leve, graças a esse consenso, como você faz para pôr os pés no chão?
Bem, isso é algo que se aprende cedo quando você entrega a sua vida à literatura. A questão central da vocação não é travada perante o público, mas na privacidade quase absoluta, que é na ação de escrever. Uma tarefa literária, como escrever um romance, leva tempo, faz com que o escritor atravesse momentos de insegurança, de confusão. Depois, se o enredo vai fluindo e você começa a dominar essa massa, que no princípio era complexa, você começa a sentir uma satisfação cuja compensação é de vivenciar esses momentos. O que vem depois...

Você continua achando que quando esse tempo passar o seu melhor romance será Conversa na Catedral?
Olhe, não sei. Penso que não tenho a distância suficiente para emitir uma opinião sobre isso. Posso afirmar, isso sim, que este foi o romance que mais trabalho me deu, e gostaria que a obra que me deu mais trabalho fosse considerada como a melhor.”
Leia a entrevista completa em www.caratula.net

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