“Em entrevista, a professora e socióloga
Maria Dolores de Brito Mota explica por que mulheres continuam sendo
assassinadas no Brasil
Maria Eduarda Carvalho, Revista Fórum
O feminicídio se difere do homicídio por se
tratar de um crime cultural, motivado por discriminação de gênero. É o que
explica, em entrevista à Fórum,
Maria Dolores de Brito Mota, socióloga e professora da Universidade Federal do
Cerará, UFC.
Maria Dolores, líder do Núcleo de Estudos e Pesquisas
sobre Gênero, Idade e Família da UFC, explica os motivos que levam ao
crime de gênero, que vem aumentando principalmente entre adolescentes. A
socióloga também discorre sobre o papel da mídia e chama a atenção para os
efeitos práticos da criação de um sistema de informação nacional sobre
feminicídio no Brasil.
Revista Fórum – O Mapa de Violência 2012 publicado
pelo Instituto Sangari revela que, entre 1980 e 2010, foram assassinadas
aproximadamente 91 mil mulheres no país. Mais de 90% dos crimes ocorreram
por questão de gênero, os chamados feminicídios. A que se atribui o
feminicídio?
Maria Dolores – A uma cultura patriarcal
machista e o nosso próprio código penal reflete essa cultura. Até pouco tempo
era bastante aceitável, digamos assim, no âmbito do judiciário, as mortes por
defesa da honra. Era um atributo que a sociedade patriarcal brasileira
permitia. A própria novela Gabriela [atualmente exibida na rede Globo] retrata
um caso desses. Era muito comum os homens se sentirem ofendidos quando as mulheres
se envolviam em outras relações, bastava o simples ciúmes ou a recusa do fim do
relacionamento, quando esse fim era colocado pela mulher. Na nossa cultura o
homem define a relação, é o querer dele, o desejo dele que determina se uma
relação continua ou não. E quando havia a recusa, quando o desejo da mulher se
manifestava e ela não queria mais manter a relação naquele nível, o homem se
dava ao direito de não aceitar e isso era levado até as últimas consequências.
A cultura patriarcal é o que leva a um índice tão alto de feminicídio no
Brasil.
Fórum – Muitas mulheres são, na verdade, meninas
ainda, em grande parte adolescentes. O que esses feminicídios juvenis indicam?
MD – Essa é uma questão importante. As garotas cada vez mais jovens são
alvo dessa violência de gênero, e não é só porque a gente vive uma cultura de
violência generalizada. É que [a violência] sempre vai se voltar de forma mais
forte para o sujeito colocado numa posição de vulnerabilidade e discriminação,
como é o caso da mulher e da própria figura da menina, que é extremamente
sexualizada. Estamos passando por um processo de sexualização da adolescência
que estimula que as meninas sejam vistas e colocadas como objeto sexual. Isso é
uma questão que o próprio movimento de defesa da criança e do adolescente vem
se deparando. Há uma polêmica enorme, por exemplo, entre a secretaria de
Direitos Humanos da presidência e a secretaria de Políticas para as Mulheres.
Quando o movimento feminista trabalha com mulheres acima de 18 anos e encontram
crianças de 11 ou 12 anos, que estão em situação de exploração sexual, eles
encaminham para a secretaria de Direitos Humanos e para os movimentos em defesa
da criança. Percebe-se que há uma ambiguidade, quem cuida dessas meninas? Isso
é complicado, mas vejo esse fenômeno como um sinal de que há uma mudança na
questão da adolescência. A infância está se encurtando muito. Isso ocorre por
um processo cultural e, por outro lado, por conta da questão da sexualização
muito forte na nossa cultura. Isto é uma outra discussão que precisamos fazer
no Brasil: entender qual é o significado hoje da sexualidade, do corpo sem
entrar em questões de moralidade.”
Entrevista Completa, ::AQUI::
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