por Emir Sader, Brasil 247 -
A direita latino-americana fez tudo o que pôde, falsificou a realidade, apelou para a fraude jurídica, para o marketing eleitoral para interromper os governos que punham em prática politicas antineoliberais. Não tinha projeto de país. Seu objetivo era prestar mais um serviço às oligarquias dominantes, interrompendo governos que governavam para todos, promoviam a integração social, fortaleciam o Estado e adotavam politicas externas de soberania nacional.
Na Argentina a direita
conseguiu voltar ao poder por meio de eleições, no Brasil por meio de um
golpe. Mas rápido essa diferença se revelou secundária. Colocam em
prática, de novo, políticas neoliberais, muito similares entre si, como
havia ocorrido nos anos 1990. E fracassam novamente, de maneira muito
similar.
O retorno da direita na
Argentina parecia apresentar as melhores condições para o projeto de
restauração neoliberal. Um candidato que havia sido presidente do Boca
Juniors numa fase sumamente vitoriosa do seu time de futebol. Depois foi
prefeito de sucesso na cidade de Buenos Aires por dois mandatos, tendo
eleito seu sucessor. Uma imagem jovem, de executivo de sucesso, com um
marqueteiro competente, conseguiu derrotar o candidato de Cristina para
presidente da Argentina e para governador da província de Buenos Aires,
concentração histórica da classe operária peronista. Com o prefeito de
Buenos Aires e os governadores das duas principais províncias do
interior, conseguiu que seu partido chegasse aos postos chave do sistema
politico argentino.
Mesmo sem maioria no
Parlamento, joga com os recursos do governo federal às províncias e com
divisões dentro do peronismo para conseguir aprovar boa parte dos
projetos que manda ao Congresso. Cronistas apressados – inclusive entre
os que se julgam progressistas – se precipitaram a prever que o macrismo
vinha para ficar como o grande partido da direita argentina, que Macri
seria favorito para reeleger-se em 2019 e que a derrota eleitoral da
esquerda seria de longo prazo.
“O Plano A está
funcionando. Mudancas graduais, mas profundas. A economia cresce por
segundo ano seguido, cria emprego, diminui a pobreza e tudo acontece
liderado pelo investimento e enquanto corrigimos desequilíbrios. Vamos
chegar a 2019 crescendo três anos seguidos, e no momento das eleições,
crescendo a mais de 5%.” Mensagem escrita por um alto funcionário do
Ministério da Fazenda argentino dia 22 de abril a um jornalista do Le
Monde Diplomatique daquele pais, que comenta; “Duas semanas depois, a
terra tremia e Macri anunciava que volvíamos ao FMI. Algo tinha falhado:
o Plano A tinha se esgotado e não havia plano B.”
Havia sinais de que as
coisas tinham mudado na Argentina. Macri conseguiu aprovar a reforma da
previdência mas, devido à forte resistência do movimento sindical, não a
reforma laboral. Manifestacões de rua foram violentamente reprimidas e o
apoio a Macri foi descendo. Até que veio a crise atual, possível porque
o governo não conseguiu conter a subida do dólar, mesmo gastando 10
bilhões de dólares para tentar estabilizar o câmbio. Os argentinos não
acreditam mais nos bancos desde a crise de 2001/2002, quando se sentiram
traídos por eles, ao mudar a paridade da moeda argentina de 1 a 1, para
4 a 1, se sentiram lesionados e passaram a poupar em dólares. Dai que
diante de qualquer incerteza econômica, correm a comprar dólares e se
acelera a disputa pelo valor da moeda norteamericana.
Até que Macri anunciou
que o pais iria buscar recursos com o FMI, com todas as consequências
correspondentes. Obteve 50 bilhões e a carta de intenções, com as
maldades correspondentes, começa a ser revelada aos poucos. Do FMI ja
anunciam que: O povo vai ter que sofrer. Não se sabe de onde mais vão
cortar, já que nestes dois anos ja se colocou em prática um duríssimo
ajuste fiscal, com desemprego, recessão e empobrecimento generalizado,
ao lado da fuga de capitais, do aumento da divida publica e do aumento
da inflação, que chega a 27% este ano, apesar de todos os cortes de
recursos públicos.
O clima econômico mudou
rapidamente, com o conhecido sentimento que vai da euforia à maior
depressão, o prestigio de Macri se aproxima ao de Temer, se questiona
fortemente se poderá se reeleger em 2019 ou até mesmo se vai concorrer.
Mesmo sua filiada preferida, Maria Eugenia Vidal, jovem governadora da
província de Buenos Aires e eventual candidata alternativa, sofre as
consequências desse desgaste.
Em suma, nas melhores
condições da restauração neoliberal, o projeto argentino fracassa
estrepitosamente, ao retomar, pura e simplesmente, o modelo neoliberal
dos anos 1990, centrado no ajuste fiscal.
Para confirmar que a
direita latinoamericana não tem nada a propor senão o ajuste neoliberal,
no Brasil também se retomou o projeto fracassado nos anos 1990, como se
nao houvesse passado nada desde então, nem seu fracasso, nem o sucesso
dos governos que priorizaram o crescimento econômico com distribuicão
de renda. E, apesar do clima artificialmente criado de que estaria
havendo uma recuperação econômica, ela não resistiu às greves dos
caminhoneiros e dos petroleiros e volta a se instalar,
generalizadamente, o clima pessimista, com índices de suposto
crescimento se aproximando de zero.
Brasil e Argentina
retomaram o modelo neoliberal dos anos 1990 e fracassam de novo. Fica
reaberto o caminho para que governos progressistas retomem o caminho do
modelo alternativo, antineoliberal, de crescimento econômico com
politicas sociais, de resgate do papel ativo do Estado e de politicas
externas de integração regional e intercambio Sul-Sul. O espasmo
neoliberal durou pouco.
Comentários