“Nossas máquinas são poderosas e a
tecnologia avança numa velocidade que até dá vertigem. O nosso jeito de ser
civilizado, com o desenvolvimentismo a todo custo, nos conduziu a um momento na
história da Terra em que temos nas mãos o poder de traçar o nosso próprio
destino como espécie. É a Era Antropozoica, já reconhecida pelos estudiosos do
assunto. Que fique claro que não se trata uma verdade absoluta. É mais ou menos
como as doenças evitáveis. Uma pessoa pode optar por não ser fumante,
acreditando que com isso vai evitar o enfisema e o câncer nas vias
respiratórias. No entanto, por outras razões, artificiais ou naturais
(genéticas, por exemplo) essa pessoa pode vir a desenvolver uma dessas doenças.
Podemos fazer todas as lições da sustentabilidade e mesmo assim sermos
exterminados pela patogenia de um vírus mutante, ou mesmo por uma pedrada
sideral, como se acredita ter ocorrido com os Dinos, há 65 milhões de anos.
Mas o fato é que o velho mandamento do
Pentateuco “Crescei e multiplicai-vos, enchei a Terra e submetei-a” foi
cumprido da forma mais bruta e cabal. A manada humana atingiu um número
assustador de indivíduos e nossa civilização chegou a uma concepção de vida em
que viver consiste em ser feliz. E felicidade é consumir. E consumir implica em
emitir gás estufa, consumir o planeta com a mesma voracidade com que as
lagartas consomem as folhas de jasmim. Nossa felicidade é poluidora, daí que
adotar um novo estilo de vida, que seja ambientalmente sustentável, nos
causaria imensa dor. O que queremos é ser felizes. Ainda que com isso estejamos
comprometendo a nossa própria continuidade. Trocar o nosso conceito de
felicidade, ou mesmo abrir mão da felicidade no conceito atual parece estar
fora de cogitação. Este motivo vem se juntar aos demais que já listamos em
outros artigos das razões pelas quais é muito difícil tomarmos uma atitude
efetiva, no particular e no coletivo, que implique em maior sustentabilidade
dos recursos naturais.
Já existe um descompasso entre o consumo e
a regeneração ambiental. Segundo o "Living Planet Report" do Fundo
Mundial para a Natureza (WWF) “no final do anos de 1980, a humanidade passou a
consumir recursos mais rapidamente do que a Terra poderia regenerá-los, e essa
lacuna está aumentando a cada ano. Os impactos planetários dos estilos de vida
altamente consumistas praticados no mundo industrializados não podem ser
generalizados: o fato é que o planeta simplesmente não é capaz de arcar com
muitas pessoas que consumam como os norte-americanos”. Segundo um estudo que
pode ser visto em aqui, se todo mundo vivesse da mesma maneira que um
norte-americano médio, simplesmente precisaríamos de 5,3 planetas com recursos
semelhantes aos da Terra. E até agora os poderosos olhos do Hubble não
vislumbrou nem 0,3 planeta com essas características na imensidão dos anos-luz
do firmamento em que seu olhar perscruta infatigavelmente.
E, para preocupação geral do dos
terráqueos, essa disparidade de consumo entre um cidadão de país rico e outro
de país pobre, antes de gerar a necessidade de se buscar maior parcimônia e
equilíbrio no consumo dos bens, gera mesmo é a sensação de injustiça. Primeiro
a pergunta fatal: por que eles consomem tanto e nós consumimos tão pouco? Ou
seja, por que eles são tão felizes e nós tão fracassados? Os grandes
consumidores não perguntam nada. Num segundo momento, essa sensação de
injustiça vai se agigantar, quando vierem as intempéries do clima (elevação dos
mares, secas, dilúvios, calor horrível, desertificações, declínio da
fertilidade do solo), as doenças e a escassez de todo tipo e os pobres do mundo
saberem que o seu terror é consequência direta da felicidade auferida por
outros que acabaram por brocar o planeta antes que os pobres tivessem acesso à
felicidade.
Quanto se trata de poupar a natureza e, por
consequência, a vida, o mundo está cheio de Pilatos. A china, por exemplo, que
já vem alçando-se à condição de o maior emissor de gás de efeito estufa em
razão de ter se tornado o chão de fábrica do mundo, já avisou: “Precisamos de
um novo modelo de desenvolvimento que signifique altos padrões de vida com
emissões mais baixas per capta. Se alguém encontrar esse modelo, a China o
seguirá.”
Enquanto ninguém assume uma posição moral e
efetiva de defender a plataforma que nos sustém, os indicadores econômicos, ao
estilo norte-americano, continuam sendo o talismã da civilização. Ou seja: é
mais importante o registro de crescimento e lucro no balanço do fim do ano do
que assegurar a existência da vida no final do século.”
Comentários