“A recepção da obra de Hannah Arendt no Brasil comporta duas fases. A primeira iniciou-se em 1972, com a publicação de Entre o passado e o futuro, lançado nos Estados Unidos em 1961. A iniciativa da tradução foi de Celso Lafer, que escreveu um estudo introdutório. Em depoimento recente, ele relatou que a indicação do livro para publicação foi da própria Hannah Arendt (com quem tinha estudado em meados dos anos 1960), o que revela a importância que a autora dava a esta coleção de ensaios. No ano seguinte, 1973, apareceu a tradução de Crises da república, cuja edição americana é de 1969. O livro foi publicado no Brasil, portanto, apenas quatro anos após seu lançamento. Os dois livros foram publicados por uma nova editora, Perspectiva, criada em São Paulo , em 1965, por Jacó Guinsburg, que organizava uma coleção de livros de autores judeus e estava iniciando uma série de grande sucesso ― a Debates. Em 1975, a editora Documentário, do Rio de Janeiro, publicou a primeira parte de Origens do totalitarismo ― Anti-semitismo. Também este livro contém uma apresentação de Celso Lafer, que, ao final, considerava a importância de inserir a obra de Hannah Arendt nas discussões sobre o judaísmo no Brasil. O autor entendia que, para o exame do processo de assimilação da intelectualidade judaica, era preciso levar em conta a presença de uma tensão, afinal positivamente solucionada, entre a adesão aos valores considerados universais e o vínculo à identidade judaica. Não obstante o apelo de Celso Lafer, esse viés de interpretação do pensamento arendtiano permaneceu pouco explorado entre os leitores brasileiros. A tradução da principal obra, A condição humana, por Roberto Raposo, responsável por todas essas primeiras traduções, saiu pela editora Forense, em 1981.
Dignidade da ação política
Já na primeira fase da sua recepção, a obra de Hannah Arendt alcançou junto ao público significativa acolhida, que assegurou edições sucessivas de todos os livros. Alguns passaram a ser, desde aquele momento, verdadeiros sucessos de venda, o que contrasta com a pouca atenção dos universitários à obra da autora, por quase duas décadas. Tudo indica que Hannah Arendt sempre teve, não apenas no Brasil, um público bastante amplo de leitores leigos, não-especialistas.”
Eduardo Jardim, Digestivo Cultural
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