A Criação em tempos de Crise

Marcelo Spalding, Digestivo Cultural

"Muito já se escreveu e foi dito, se escreverá e se dirá sobre a Crise Econômica Mundial, que parece realmente digna do banalizado termo. Queda nas bolsas, inadimplência, demissões, retração. Obama, de certa forma, já é um produto da crise, tanto sua eleição quanto a enorme expectativa gerada em torno dele. Assim como o desprestígio do antes queridinho Sarkozy na Europa, a confusão das eleições israelenses, a aceleração do nosso PAC. Até a demissão do Felipão pelo Chelsea tem alguma coisa a ver com a crise... Mas permitam-me esquecer, neste fórum de debates culturais, dos números, das bolsas que caem ou sobem, dos empregos perdidos e das empresas que se aproveitam da onda para demitir, enxugar. Quero me concentrar no processo criativo, na criação em tempos de crise.

Quantos contos não nasceram de uma perda?
Quantas músicas não surgiram de uma traição?
Quantos tratados não foram escritos por raiva, vingança?

Henry David Thoreau, o fundador do anarquismo, teria escrito A desobediência civil depois de ser preso por sonegação de impostos. Machado de Assis, o gênio brasileiro, escreveu seu melhor conto, O Alienista, e seu melhor romance, Memórias Póstumas de Brás Cubas, num período de grave debilidade física. Vinicius de Moraes, o poeta do "eterno enquanto dure", casou e descasou diversas vezes para viver (ou para compor?) algumas das mais belas canções da nossa música. E se assim o é com os gênios, que dirá conosco, os mortais.

Caio Fernando Abreu já dizia que escrever é vomitar, vomitar aquilo que há de mais oculto em nosso interior, vomitar fantasmas, medos, iras. Clarice Lispector, em sua derradeira e emocionante entrevista, conta que quando não está escrevendo, está morta, vazia. Porque o ato da criação é, em geral, muito particular, muito inspiração, sentimento, ainda que cada vez mais se exija técnica mesmo dos não-gênios, como nós. Um bom texto, uma boa música, não é apenas uma construção tecnicamente perfeita, é também aquela pitada da nossa existência que compartilhamos, que deixamos naquela história, naquele poema, naquela canção. É a dor que o poeta sente, ou não sente, como diria Pessoa, que dá alma à criação, que a diferencia de uma tese de doutorado, de um processo criminal, de uma notícia de jornal. Criar é se expor, é transbordar-se, e nada melhor que um momento de crise para criar.”
Artigo Completo, ::Aqui::

Comentários

Anônimo disse…
E quando se começa a escrever, o simples fatode se pensar em parar é como morrer sufocada no silêncio.

Miluz

Recomendado para Você..