Um vivo e um morto

Tou de olho. Não posso cochilar. Aqueles moleques de ontem. Tão arrodeando. Se voltarem hoje vou mandar prender

Reila Márcia Miranda da Silva , Silvia Adoue / Brasil de Fato

Tou de olho. Não posso cochilar. Aqueles moleques de ontem. Tão arrodeando. Se voltarem hoje vou mandar prender. Acham que tou de brincadeira? Faço meu serviço. Fico atento. Na fábrica ninguém entra sem permissão dos homens. Tem que mostrar o papel.
Carimbado. Sou responsável por este negócio. Cuido do portão e das janelas. Esses moleques fazendo zoeira. Não pode jogar pedra não! O teu pai não te deu educação? É assim: faltou cinto, entortou. O pessoal que entra aqui é pra trabalhar. Tem três turnos, que a fábrica não para. Vagabundos, longe daqui. Eu cuido que não venham fazer vandalismo. Essa janela aí que quebraram foi quando eu não estava. Quando eu estou, boto os moleques pra correr. Fico aqui a noite toda. Fico de dia. Faço hora extra. Mas nessa hora não estava não senhor. Quando eu estou no turno não tem essa de jogar pedra.

Já trabalhei na produção. Oito horas na frente da injetora. Hora extra, eles pagam direito. Nunca faltei. Ganho prêmio de freqüência. Prêmio de pontualidade. Deu pra comprar o lote. Deu pra fazer o barraco. Depois, alvenaria. Aos poucos. Comprava o material levantando primeiro um cômodo, depois outro. Aos domingos. A mulher queria cimentar tudo. Os meninos crescendo.

Lá vêm eles. Eu vou botar pra correr. Não brinco em serviço. Cês dois, pode voltar pelo caminho que vieram. Não quero ver vocês nessa calçada!

- Desculpe, tio.

Tio, uma ova! Não sou seu tio! Eu quero lá sobrinho vagabundo? Pode se mandar! Conheço esses dois. Conheço esses maloqueiros de boné. Boné é pichação na certa. Nesse muro da fábrica ninguém picha. Que eu tou aqui tomando conta. Não ta vendo o uniforme? Sou vigia! Já fui da produção. Agora cuido do portão e do muro. Comigo aqui não tem pichação. Aquele homem falou. Tem serviço procê lá na fábrica. Tinha colocação de pião. Diz que tinha cartaz: A-di-mi-te-se, serviço geral. Que é pião. Eu pegava no pesado. Fazia tudo que mandava. Depois fui pra injetora. Serviço de responsabilidade. Comigo não tinha essa de licença médica. Não tinha essa de greve. De sindicato. Vagabundage. Quero distância de vagabundo. Bando de moleque. Tenho mais o que fazer. Nunca deixei cair a produção. O supervisor confia.”
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