Escola

Tony Monti, Terra Magazine

“É preciso coragem. Não tenho irmão mais velho que me mostre os caminhos nem sou filho único para ter exclusividade da atenção dos pais. Cheguei para meu primeiro dia de escola aos cinco anos de idade. Corri com minha irmã num pátio enorme e vazio, meus pais observando. Era meio de ano. Meus colegas de classe, que eu não conhecia, já estavam em aula havia meses. O plano era me deixar na escola no fim do período. Eu ficaria uma horinha na sala e, na saída, meus pais já estariam lá. Estariam lá o tempo todo, me esperando. Na hora de entrar, chorei. Minha irmã ficou com eles e eu entrei na sala cheia de crianças bastante bem integradas. Demorou mais que apenas a última hora daquele dia: acabei gostando.

Nas mesas, cabiam quatro pessoas. Conheci, lá, uma menina de cabelo escuro e pele clarinha. Triste não lembrar do nome dela, talvez Fernanda. Sentei por todos os últimos meses do ano na mesma mesa que ela. Isso facilitou bastante minha estadia na escola (continuo me apaixonando por alguma menina na escola de Francês para suportar bem hora e meia de aula).

Um dia destes meses, tímido - troquei parte da timidez por algum silêncio; a própria timidez, quando bem conhecida, vira estratégia -, não pedi à professora para ir ao banheiro. Adiei até quase a dor. Não me lembro se imaginei que iria ao banheiro em casa, quando fosse embora, não sei qual foi a elaboração mental que escondeu a vontade. Doeu. Pedi e fui. Imagino agora, não há como lembrar, que era a primeira vez em que eu pedia à professora para ir ao banheiro. No corredor, na metade do caminho, minhas calças já estavam molhadas.

Corri como algumas vezes fiz, já adulto, fugindo de algum problema. As freiras da escola me seguraram quando eu já estava na rua, e continuaria correndo por um bom tempo, é assim, e não voltaria para casa porque não sabia o caminho.

Na volta à classe, a professora - tive boas professoras nesses primeiros anos, sei disso porque sorrio quando hoje lembro delas - me colocou para assistir aula ao seu lado, em cadeira especial. Cuidou direitinho de mim. Que eu me lembre, não houve espanto maior entre os outros alunos pelo fato de eu não voltar para as mesinhas coletivas. Alguns anos mais tarde, eu era professor numa quinta série, meninos correndo pela sala enquanto eu falava. Todos menos um sentaram-se depois de uma conversa amiga. Um continuou correndo, passou por mim, desviando dos meus pés para não tropeçar, enquanto eu contava alguma história. Segurei o Bolinha pelo ombro, ele era bem pequeno, menor que os colegas, e continuei a aula abraçado, de lado, com ele. Ficou quietinho. Os demais também. Ninguém comentou. Voltou para sua carteira minutos depois e a correr pela classe na aula seguinte.”
Este conto é parte integrante do livro "o menino da rosa", publicado pela editora Hedra em 2007.

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