A excelência do espírito

Guilherme Montana, Digestivo Cultural

"São trinta quilômetros sobre esquis. A prova, esqui cross country para mulheres, estilo clássico, largada em massa. O dia, 27 de fevereiro de 2010. Olimpíadas de Inverno de Vancouver, Canadá. Na massa de atletas, a favorita, a norueguesa Marit Bjoergen, que já havia conquistado cinco medalhas nestes jogos olímpicos, e que desde 2005 não brilhava tanto; e a polonesa Justyna Kowalczyk, uma medalhista em ascensão. Mesmo quem não é familiarizado com esportes de inverno, como nós, brasileiros, por motivos óbvios, jamais se esquecerá do quão extasiante foi ver aquelas mulheres lutando pela medalha de ouro numa das provas mais glamorosas dos jogos de inverno.

Vinte e cinco quilômetros já haviam sido vencidos. A cinco quilômetros de terminar a prova, Bjoergen tinha uma vantagem de 1,9 segundos sobre Kowalczyk, que, mesmo sendo a campeã mundial da prova em 2009, alimentava poucas expectativas no público de vencer a norueguesa que já ostentava cinco medalhas em Vancouver, das quais três, de ouro. Mas essa é toda a graça: superação é vencer a si mesmo vencendo o mais forte. E nos cinco quilômetros restantes, sobre e sob neve, elas disputaram milésimo por milésimo a vitória. No sprint final, virtualmente empatadas, quem estivesse assistindo a prova estaria se descabelando, independente de para quem fosse sua torcida.

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Fico impressionado com a fragilidade do corpo humano. Nós não somos os mamíferos mais fortes, nem os mais rápidos. Talvez os mais inteligentes. É certo que, entre os primatas, o Homem é o que tem o maior pênis, eis aí um motivo de orgulho viril; mas, ainda assim, jogados numa jaula um chimpanzé de 60 quilos e Lou Ferrigno, com aquele físico da época em que estrelava a série Hulk, não sinto em informar que o chimpanzé sairia vencedor, empalitando os dentes com um dos braços do Ferrigno. (Não imagine a cena, foi tudo uma metáfora.) A nossa vantagem sobre os demais familiares do reino animal é a dita racionalidade. Que se resume assim: eu não corro como um guepardo, mas nunca vi felinos pilotando Hayabusas.

Em comparação direta com os demais animais, sempre levaremos desvantagem. Mas o esforço que o ser humano faz para superar essa fragilidade inata é inebriante. Não falo do esforço pelo esforço, porque isso é vazio. Esses recordes de apneia estática são um exemplo disso. Permanecer submerso por vinte minutos, apenas para permanecer vinte minutos submerso e ser listado no Guinness Book, é uma demonstração ordinária de poder. Não, não falo disso. Falo de Gabriele Andersen-Schiess, e não me importa que isso seja clichê. Nem um pouco. A imagem da fundista suíça terminando em frangalhos a maratona nas Olimpíadas de Los Angeles, 1984, ainda hoje me assombra.”
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