Normalizando a incultura

Na literatura, os escritores não precisam buscar novos caminhos formais ou visões inéditas de mundo, basta reproduzir os valores, a ideologia, a situação social, ética e cultural do seu público. O artista deixa de ser artesão e vira microempresário”

Márcia Denser, Congresso em Foco

Algumas ideias do crítico argentino Juan José Saer (autor de A Pesquisa e Ninguém Nada Nunca, da Cia de Letras) continuam extremamente pertinentes no debate (ele ainda existe?) de como a ideologia neoliberal levou a arte e a cultura à irrelevância. Neste âmbito, a questão toda se coloca na suposta oposição entre moderno e pós-moderno. Num ensaio publicado em 2001, ele afirma que à imensa tirania das vanguardas se opõe o falso democratismo pós-moderno. Em seu oco relativismo, os contrários, quando não se conciliam, coexistem em plano de igualdade – como Paulo Coelho e Guimarães Rosa – apenas porque ambos são romancistas.

Ao fazer do público a instância decisiva do processo criador, o pós-modernismo legitima: a) o endeusamento do “popular”; b) a rejeição da complexidade formal. O pseudo-democratismo pós-moderno é a expressão da ideologia ultraliberalista – que decretou o fim da história – levada à cultura. Apesar de suas reivindicações de liberdade, está vinculado à ideologia neoliberal, aliás, é instrumento desta. Reivindica ao debate frouxas e vagas categorias de consenso com o que exclui toda tentação de ruptura. Assim como o público é juiz supremo da pertinência artística, o academicismo é um novo classicismo e o discurso artístico se confunde com os valores da opinião.

Na literatura, os escritores não precisam buscar novos caminhos formais ou visões inéditas de mundo, basta reproduzir os valores, a ideologia, a situação social, ética e cultural do seu público. O artista deixa de ser artesão e vira microempresário. Não há mais movimentos literários em torno de uma filosofia ou uma estética como os modernistas, os concretistas, os românticos, etc., mas empreendedores isolados com obras de acordo com demandas do mercado – o que melhor fixa a marca de um autor –com produtos derivados (merchandising), onde outros trabalham até anonimamente.”
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