A riqueza do mundo e a herança dos otários

Edival Lourenço, Revista Bula

“O Homo sapiens, este bípede implume, mamífero por condição e pretensioso de nascença, é um animal encantador, que se diferencia de toda bicharada pelo o uso da razão e pelo porte da moralidade. E é ao mesmo tempo um tanto çinixtro, exatamente por ser moral e dotado de raciocínio e se negar a usar essas faculdades praticamente exclusivas para se resguardar como espécie, neste momento da história em que toda a fauna humana passeia perigosamente numa frágil e movediça passarela sobre os horrores de um abismo.

Poderíamos dizer que a moral é uma invenção platônica, engendrada a partir das ideias de Sócrates (469-399 a.C.). Do ponto de vista formal, esta atribuição não é de toda descabida, mas, do ponto de vista intuitivo, algumas noções de moral, ainda que de forma rudimentar, sempre estiveram entranhadas na consciência do homem, desde tempos neanderthais.

Para a moralidade platônica nada pode fazer mal a uma pessoa de bem. Alguém que aja com senso de ética, justiça e equidade sempre estará resguardada dos solavancos do mundo. Essa noção foi migrada inteira, sem supressões nem retoques, para o arcabouço do cristianismo, onde foi totalmente absorvida. Quem é bom sempre terá a seu dispor um caminho ladrilhado de pétalas de rosas e um horizonte azul onde abrigar seus sonhos, sempre realizando de forma crescente. Paz na terra aos homens de boa vontade, diz o aforismo deôntico. A contrário senso, quem é mau pagará o preço de sua maldade, do jeito de quem cospe pra cima.

Outras religiões de ancestralidade órfica, como o kardecismo, por exemplo, tratam esta questão de forma ampla, abrangente e tranchã: errou, pagou. Não tem escapatória. Não há quem cometa uma besteira impunemente. Ninguém passa por uma situação de perrengue por acaso. A vida é tão somente um balcão de acertos, onde lhe é debitada toda a despesa da vida, seja dos excessos do presente, seja dos excessos de vidas passadas.

Em contrapartida, ninguém usufrui de uma vida augusta sem que seja para receber os créditos pendentes, conquistados num padecimento anterior. Se você veio ao mundo com créditos e bônus, tudo bem; nada deterá sua vocação para ser feliz. No entanto se gastou suas pratas em vidas passadas e ainda deixou a conta da última farra pendurada no cartão de crédito, terá de ralar implacavelmente até o último dia de sua vida, quiçá numa próxima que tiver.”
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