De volta ao passado


Rui Martins, Direto da Redação

“Na rua, alguns carros levantavam uma poeira avermelhada, criada pela estiagem de três meses, e o sol forçava os passantes a escolher o lado da sombra ou a colocar um chapéu de boiadeiro.

Meu relógio marcava pouco mais de meio-dia e, de pé, aguardava o atendimento, na fila de um banco, na cidade vizinha ao meu vilarejo natal. O espaço era diminuto, mas situado no primeiro andar, nos protegia dos escaldantes raios solares. Será o calor que nos faz falar e trocar idéias com desconhecidos ? Por que as populações meridionais parecem mais falantes e mais extrovertidas ? Quantas situações similares já vivi em Paris ou Genebra, mas num tedioso silêncio, enquanto aguardava chegar minha vez.

Conversávamos. Para mim, recém-chegado, reouvir pessoas falando na minha língua é sempre um agradável reencontro que agora, renovo anualmente. A questão passou a ser documentos e a maneira mais rápida de se obter sua carteira de identidade, possibilidade criada pelo Poupa Tempo. Já havia ouvido falar e o tema me interessava porque preciso orientar minhas filhas sobre como tirarem a carteira de identidade. Um senhor, pouco distante na fila, contava com alguém de sua família renovou sua identidade em tempo recorde, nesse serviço na Praça da Sé, centro de São Paulo.

Agradeci a informação e como tenho a tendência de falar demais, contei que, por viver no Exterior, tenho de me reatualizar periodicamente sobre as novidades brasileiras. Uma coisa puxa outra e, logo me perguntaram desde quando vivo no Exterior, dei uma resposta precisa e já repetida tantas vezes – desde 1969, exílio durante a ditadura militar.

Longe estava de imaginar que essas palavras provocassem, lá dentro, o levantar de uma poeira, negra e irrespirável, no corredor apertado, onde esperávamos nossa vez.

« A época militar foi a mais próspera deste País », vaticinou um senhor, que se identificou como ex-militar, agora aposentado. E, de repente, ali na minha frente sorvido por uma espécie de buraco negro, tive a impressão de ter retornado àquela época conturbada da ditadura, do receio de ser preso, das arbitrariedades policiais, das torturas, do silêncio forçado.”
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