Literatura & realidade histórica

Se a literatura não é auto-ajuda, nem entretenimento nem informação de luxo, ela simplesmente está fora, out, não conta para o mercado e distinto público consumidor”

Márcia Denser, Congresso em Foco

Para muita gente dita pós-moderna, estas três palavras colocadas juntas - literatura, realidade, histórica – não fazem muito sentido no aqui e agora, tão contaminado pelas formas do “politicamente correto” e suas consequências entranhadas de intolerância estúpida e razão (instrumental) louca. Mas para leitores e escritores que ainda não desacreditaram (como eu) da literatura e sua força epistemológica, ou seja, de condutora do saber neste universo extremamente esquizofrênico e fragmentado, esta é a boa nova inscrita no livro "Ficções do Desassossego" (Rio, ContraCapa, 2010) de Lúcia Helena, uma das nossas grandes mestras da crítica literária, cujas contribuições mais recentes são a organização dos volumes "Nação-Invenção: ensaios sobre o nacional em tempos de globalização" (2003), "Literatura e Poder" (2006), "Literatura , intelectuais e a crise da cultura" (2007), atualmente coordenando o grupo de estudos Nação e Narração (CNPQ).

De Lúcia Helena não posso dizer que somos amigas nem velhas conhecidas, pois não a conheço pessoalmente, mas posso afirmar antes que somos “velhas companheiras de viagem” – e lá se vão trinta anos – desde que nos apreciamos mutuamente à distância – ela no Rio e eu em Sampa - no percurso em comum pela paixão literária. Sem contar que o nome desse grupo de estudos, Nação e Narração, me conquistou de fato, eu, que desta coluna solitária, há cinco anos e pico, tento estabelecer todas as conexões possíveis entre política, cultura e literatura brasileiras, tentando recuperar para o leitor (e para mim mesma) a integridade perdida decorrente da fragmentação que nos foi imposta sob o rótulo de “pós-modernidade”.

Ironicamente, escritora que sempre fui considerada entre rebelde e maldita, minhas relações com a academia são e sempre foram as melhores possíveis, até porque rebelde e maldita sim, mas não estúpida a ponto de não considerar os textos acadêmicos como parte essencial – possivelmente o gêmeo sombrio da dupla criador e crítico – do nosso sistema literário – que, segundo Antonio Cândido (e a própria Lúcia Helena a reportá-lo neste livro) “foi a ficção latino-americana do século XIX, em especial a brasileira, que teria produzido, por falta de tradição filosófica e duma sociologia da cultura, reflexão extremamente importante nesse campo. Ao que parece, o raciocínio permanece válido, feliz e infelizmente, pois tanto revela a vitalidade da literatura quanto a permanência do mal-estar de nossas teorias econômicas, sociais e antropológicas.” Não fosse a academia a identificar e reconhecer tal fenômeno – a importância da ficção para conferir a nós, brasileiros, a nossa identidade - este cairia no esquecimento.

Voltando: esta é uma obra composta por treze ensaios que, a partir da análise de textos de J.M. Coetzee, Machado de Assis, Philip Roth, Graciliano Ramos, Clarice Lispector, João Gilberto Noll, Ronaldo Lima Lins, aborda a solidão, o esvaziamento da subjetividade, a promoção da indiferença, a sensação de vazio e a violência do espetáculo do mundo, como questões que nos fornecem meios para questionar a ausência de futuro e perspectivas na “cultura do dinheiro”.
Artigo Completo, ::Aqui::

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