Para Noel

Urariano Motta, Direto da Redação

“Costuma-se dizer que Noel Rosa transformava a sua vida em samba. Consola. Como todo bom pequeno-burguês, adoramos um artista sofrido que cante para nós a sua dor. (Há uma foto de mulher, feiticeira, há uma foto da Dama do Cabaré que deve ter tantalizado Noel. Imaginamos o que ela escreveu no verso da imagem, se alguma vez lhe deixou alguma foto: “Como prova de amizade, Ceci”.) Então se diz que ele transformava a vida em samba, mas se esquece que nos intervalos da arte Noel evitava comer na frente dos admiradores. O queixo danificado mortificava-o, o seu mastigar era um espetáculo de animal de zoo. Ele, que já havia sido chamado, num duelo de sambas, de O Frankestein da Vila.

Se tentamos apanhar Noel a partir da maioria de suas letras, que diríamos, sem erro, quase sublimes, no limite da oração, da queixa de um homem a Deus, como em Último Desejo, diante de uma melodia que não podemos expressar em palavras, diante da expressão de tal sentimento, sempre novo, tão vivo e primordial que nos faz penetrar um cheiro de sal e mar pelo nariz, diríamos, que dor, que felicidade trágica na expressão! A impressão que Noel nos deixa, em seus versos mais cruéis, é que ele compõe epitáfios. Ou enternecedores testamentos. E Último Desejo é uma expressão de última vontade bem ambígua.

E aqui cabem duas observações. A primeira delas é que o patrimônio do poeta se faz em torno de coisas, como diríamos, intangíveis: bares que jamais possuiu, álcool bebido e sumido, amor que se foi, se alguma vez houve. Visto de um modo mais geral, as letras de Noel sempre exibem uma miséria material que não atinge o seu espírito. A miséria de bens tangíveis, materiais, não atinge a miséria humana A outra observação fala da ambiguidade dos seus rompimentos amorosos. Ações típicas de quem rompe pelo afastamento físico, mas não rompe no sentimento.”
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