Você tem medo de que?


Eberth Vêncio, Revista Bula

“Eu já escrevi isto aqui e repito: tenho medo de avião e altura. Janelas, terraços, a montanha russa, o colo de mulheres altas, o Pão de Açúcar e até o Morro do Macaco. Por isto, desde que me tornei um adulto, não escalo cajueiros, não vivo mais no mundo da lua, e não sonho alto. Tudo por causa do medo injustificável de cair lá de cima.

Tenho muito medo também de animais: cobras, ratazanas, lacraias, marimbondos, vírus, bactérias, baratas (sim, eu assumo: tenho medo de baratas), e fiscais mal humorados de toda espécie. Tenho medo da malha fina. Tenho medo que descubram que eu tenho uma mixaria investida em ações da Bolsa. Tenho medo que o Governo Dilma crie uma nova bolsa assistencialista. Tenho medo de saber o que há dentro da bolsa de uma mulher.

Tenho medo da influenza, mas não me vacino (tenho medo de agulhas). Tenho medo de cólicas nos rins (dizem que dói como um parto). Tenho medo de nascer mulher. Tenho medo de depender do SUS para uma cirurgia de hérnia. Tenho medo do escuro. Tenho medo da conta de energia. Tenho medo de passar sede. Tenho medo de coliformes fecais na água. Tenho de medo de ficar louco. Medo que os cadeados sejam, enfim, usurpados, deixando escapulir um eu verdadeiro, um homem sem papas na língua, sem meios termos, uma mente sem rabo preso. Portanto, se eu me tornar insano, imploro aos doutores da medicina: tenham misericórdia, dopem a minha ira com os sais de lítio! Conduzam-me de volta à inofensibilidade, nem que seja com o mister dos eletro-choques. Familiares, assinem, por gentileza, o consentimento formal para que os cirurgiões procedam à lobotomia no meu cérebro falante. Eu suplico: cerquem a verdade a todo custo, antes que ela fuja do controle.

Tenho medo de perder uma amizade. Quando digo "amigo", refiro-me àqueles que banhariam um corpo caquético em estágio terminal, àqueles que cuidariam dos seus mortos com as próprias mãos, escolhendo a última veste, barbeando-lhes os rostos, aplicando uma maquiagem leve, tapando com algodão os orifícios. Amigo é um destroço flutuando no oceano no qual nos agarramos.”
Artigo Completo, ::Aqui::

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