Cynara Menezes, CartaCapital
“Na pequena Paulo de Faria, município de
8,5 mil habitantes a 540 quilômetros de São Paulo, a dona da casa atende outra
moradora da cidade, enviada por CartaCapital,
através da janela. Parece ter receio e vergonha e não quer dar entrevista. Sua
filha de 37 anos, viciada em drogas, está prestes a ir a júri popular na
vizinha São José do Rio Preto. O crime pelo qual Keila Rodrigues é acusada foi
ter utilizado um remédio para abortar dentro das dependências do hospital de
base da cidade, em 2006. Denunciada por uma enfermeira, foi absolvida em
primeira instância, mas no início do mês o Tribunal de Justiça de São Paulo
decidiu submeter o caso a júri popular. Se for condenada, pode pegar de um a
três anos de reclusão.
Uma pesquisa obtida com exclusividade por CartaCapital traça um retrato completo
de como são feitos os abortos no Brasil. Pela primeira vez uma revista
científica brasileira, a Ciência & Saúde Coletiva, dedicará um número
inteiro para tratar do assunto. A edição temática, financiada em parte pelo
Ministério da Saúde, será publicada em julho. Os artigos traduzem os resultados
qualitativos da Pesquisa Nacional do Aborto, produzida por uma equipe de
pesquisadores da Universidade de Brasília, que trouxe a público, em 2010, a informação de que
uma em cada cinco brasileiras de até 40 anos já fez ao menos um aborto. Revelados
aqui em primeira mão, os textos revelam a realidade sem hipocrisia: o que se
passa nas clínicas clandestinas até o atendimento na rede pública de eventuais
complicações.
“Acho
que este número dedicado ao aborto será um
marco para trazer o debate ao campo da ciência. O aborto não pode ser discutido
em termos religiosos. A religião é matéria de ética privada, as pessoas
acreditam ou não”, defende a coordenadora da pesquisa, a antropóloga Débora
Diniz, professora do Departamento de Serviço Social da UnB. “Se uma em cada
cinco mulheres aos 40 anos já fez um aborto, muita gente do seu entorno soube.
A verdade inconveniente é que o aborto faz parte da vida cotidiana no Brasil, mas
ninguém quer falar a respeito, prefere ignorar. É um silêncio inacreditável.”
Artigo Completo, ::AQUI::
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