A resposta política do realismo


“Erich Auerbach, autor de “Mimesis”:
em busca de um campo de tensões entre
obra e realidade, na história do Ocidente
Alexandre Pilati, Outras Palavras

Como abordar criticamente a obra literária? Buscando ouvir o que ela fala sobre si mesma, como dimensão estética intransitiva? Ou observando-a como reflexo do mundo, sendo um veículo de fatos existentes independente dela? Se apostarmos na primeira resposta, poderemos pensar que a literatura é infensa à vida, não passando de um arranjo de técnicas estruturadas como “finalidade sem fim” e aparatadas para a fruição fetichizada da língua empoderada apenas esteticamente. Se pensarmos, diversamente, que a literatura reflete a vida como ela é, sendo registro documental de um certo tempo e de um contexto histórico, estamos reduzindo a sua potência estética, assumindo-a como representação imediata da sociedade, como documento de suas classes e de seus tipos.

Adotar de forma unilateral uma das duas perspectivas acima seria, temerariamente, diminuir o alcance de esclarecimento da totalidade histórica proporcionado pela leitura das grandes obras literárias. E a redução do alcance de totalidade das obras literárias interessa muito à crítica academicista e à flanerie descompromissada e cínica do jornalismo cultural comandado pelos interesses das classes dominantes. Enfim, esvaziar a força política e humanizadora do texto literário interessa (1) à manutenção da literatura e da arte como artefatos instrumentalizados pela lógica da mercadoria radicalmente posta a termo pela indústria cultural e/ou (2) à manutenção, não menos fetichista, da literatura dentro da jaula edulcorada do refinamento academicista, onde o literário é apenas cânone ou instituição esnobe na face, embora esboroada por dentro.

Esse o seu grande vínculo com a luta de classes. Tais atitudes de reducionismo crítico da literatura interessam às forças sociais que desejam a manutenção do capitalismo como destino último da história e não àquelas classes que acreditam que a história não terminou (como prova a atual renitente crise do sistema!) e que o seu desfecho definitivo ainda não está dado como horizonte único. A leitura da história em movimento dentro do texto literário interessa àqueles que acreditam na superação da desumanização, da alienação, da degradação do humano em favor do capital.

Falamos daqueles que precisam se apropriar da literatura como forma de interpretação de sua condição no mundo, nas periferias, nos movimentos sociais, nas classes trabalhadoras. Para eles, deve permanecer a leitura da grande literatura, muito embora a eles tenha sido reservado um contato maior com manifestações de cultura popular, não canônicas ou não eruditas. Não sendo um problema a priori festejar as diversas formas de literatura e cultura popular, restringir o alcance de leitura das classes exploradas a esse tipo de forma artística pode, no final das contas, significar fazer o jogo das classes dominantes.”
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