Pintinhos de um dia


Quem mora numa metrópole acaba esquecendo-se dos pintinhos de um dia


Quem mora numa metrópole acaba esquecendo-se dos pintinhos de um dia. Por Alberto Villas


Claro que quem mora em Sorriso, no Mato Grosso, em Santa Rita do Sapucaí, em Minas Gerais, ou em Presidente Figueiredo, lá no interior do Amazonas, talvez ainda conviva ou tenha notícias dos pintinhos de um dia. Mas, uma pessoa como eu, que moro numa cidade como São Paulo, só mesmo conversando com Denise Fraga numa casa de campo num fim de semana, pra lembrar dos tais bichinhos.

Meu pai, por exemplo, vivia indo ao Mercado Central de Belo Horizonte comprar pintinhos de um dia. Domingo cedo a gente acordava com aquele piu piu piu sem fim e quando íamos ver lá estava ele descendo da Rural Willys com uma caixa de sapatos com pelo menos seis deles. Amarelinhos, eram só penugem e umas três peninhas na asa. Pareciam perdidos e assustados e não paravam de piar. Tinham apenas um dia, acredito eu.

O meu pai acomodava aquela turminha num caixote maior dentro do galinheiro e providenciava canjiquinha e água fresca pra acalmá-los. E não é que eles se acalmavam mesmo? Minha mãe vinha logo ver a novidade, quando olhava e eles tinham parado de piar, comentava:

- Era fome.

Quando escurecia, meu pai cobria o caixote com uma lona para que os pobrezinhos não passassem frio ou levassem susto com os gatos miando de madrugada no telhado. Com o passar dos dias, eles iam crescendo a olhos vistos. Meu pai trocava a alimentação, ao  invés de canjiquinha, agora era ração para crescimento que eles comiam sem parar e também cresciam sem parar.

Mas não era só do Mercado Central que vinham os pintinhos de um dia não. Tinha uma sapataria em Belo Horizonte chamada Elmo Calçados – acho que ainda existe – que quando chegava o mês da criança dava um pintinho de um dia de brinde para quem comprasse um par de calçados. Foi assim que minha tia Lourdes levou pro seu apartamento na Rua Rio de Janeiro um pintinho de um dia, depois de comprar um par de chinelos na Elmo.

Ficou tão encantada com o bichinho que comprou uma gaiola bem bacana pra ele, com comedor e bebedor. Mas acontece que aquele pintinho foi crescendo, crescendo e tomando conta da gaiola. Em pouco mais de um mês ela tinha um problemão pra resolver. Como tirar aquela galinha enorme, gorda e apertada de dentro da gaiola? Chamou o síndico e o sindico não esboçou nenhum sinal de solução, pelo contrário. Acho até mesmo que ficou meio bravo e assustado de ver uma galinha tão grande na área do apartamento. Era proibido. O zelador subiu pra ver se dava um jeito e deu jeito coisa nenhuma. Disse que só destruindo a gaiola com um alicate seria possível tirar a penosa ali de dentro, o que minha tia Lourdes nem cogitou. Não queria estragar aquela gaiola que custou tão caro.

Como eu peguei um avião e fui embora do Brasil, nunca mais tive notícias daquela galinha que até ganhou um nome, se não me engano. Mas pelo que  soube, muitos anos depois, a galinha passou a vida inteira ali dentro e na boa. Um pouco apertada, mas acho que ela acabou se acostumando. Chegou até a colocar uns ovos porque, depois de adulta, minha tia passou a dar ração de poedeira pra ela.

Pois é, eu e a Denise Fraga, intrigados, nos perguntamos naquela tarde de sábado: Onde foram parar os pintinhos de um dia? A gente aqui nessa cidade maluca está tão acostumado a só ver galinhas mortas nas geladeiras dos supermercados que uma vez o filho de um amigo meu que nasceu em São Paulo e nunca tinha visto uma galinha viva, quando viu uma, virou assustado pro pai e disse:

- Pai, olha uma Knorr!”

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