Ademir Luiz, Revista Bula
"O lupino escritor Monteiro Lobato, inimigo público número um dos
politicamente corretos de plantão, escreveu que “um país se faz com
homens e livros”. É verdade. Também é bom lembrar que ocorre de às vezes
algumas pessoas terem suas convicções mais profundas abaladas pela
leitura de certos livros. Esse tipo de choque pode ser muito bom,
principalmente nos casos citados abaixo. Nesse dia do livro e com esse
espírito de Anjo Exterminador, a Revista Bula lista 12 livros que certos
estereótipos ambulantes fecham a última página cantando no melhor
estilo Maysa: “meu mundo caiu…”
Se você é um…
Homofóbico enrustido e ler “Morte em Veneza” (1912), de Thomas Mann
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Poderia ser “Grande Sertão: Veredas”, de Guimarães Rosa, mas como
esses tipos dificilmente chegam perto de livros escritos por rosas,
citamos o “Morte em Veneza”, de Thomas Mann. Com “morte” no título pode
ser que o livro chame sua atenção e quando menos esperar nosso enrustido
vai estar fisgado, refletindo se esta lendo uma história de amor
trágica, que por ventura é homossexual, ou uma fábula sobre o perigo de
se contemplar a suprema beleza.
Feminista queima-sutiã e ler “Os Homens que não Amavam as Mulheres” (2005), de Stieg Larsson
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Parece perfeito: quase todos os homens da trama são canalhas,
estupradores de fato ou estupradores em potencial. A mocinha se vinga
brutalmente de um burocrata escroto que bem mereceu. A mocinha é mais
inteligente e carismática que o mocinho. A mocinha usa sexualmente o
mocinho. A mocinha engana o sistema patriarcalista que a oprime e dá um
golpe milionário no final. Seria perfeito se não fossem… as continuações
que você vai se sentir obrigada a ler e ver que estragaram tudo,
mostrando que a mocinha não é invencível nem imune aos próprios
sentimentos.
Intelectual pedante e ler “O Pequeno Príncipe” (1943), de Antoine de Saint-Exupéry
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Sim, meu caro amigo de cachimbo e pulôver, “O Pequeno Príncipe”, é
uma pequena pérola de sofisticação, beleza e sabedoria. Quem disse que
misses não podem ser inteligentes?
Comunistinha de sandália de dedo e ler “O Arquipélago Gulag” (1973), de Alexander Soljenítsin
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Sim, meu caro amigo de camisa do Che, eu sei que você sabe que, ao
contrário do que aquele careca de suspensórios do seu condomínio grita
por aí, o Holocausto aconteceu sim, mas lembre-se que as Gulags do
companheiro Stálin também. Pergunte para Alexander Soljenítsin. E não
vale dizer que todo dissidente mente, isso é uma rima, não é uma
solução.
Estudante de terceiro período de Direito em fim de festa e ler “O Processo” (1925), de Franz Kafka
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Você que sabe tudo de tudo, tente explicar as bases legais do que
aconteceu nesse livro. Se errar sua punição será a morte. Não adianta
reclamar, eu sei que não é justo nem faz sentido. Isso é kafkiano, meu
caro. A opção é acordar transformado em um inseto. Escolha.
Estagiário de Beat e ler “Almoço Nu” (1959), de William S. Burroughs
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Isso é o que pode te acontecer, se você se esforçar mais em seus
hobbies. É, talvez não seja tão ruim. Afinal, Burroughs morreu velho,
famoso e segurando uma arma, caso alguém aparecesse para reclamar.
Acadêmico sentado no trono de seu apartamento e ler “A Marca Humana” (2000), de Philip Roth
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Você pode ser vítima de um monstro que não criou, mas que não se opôs a criação.
Ativista vegetariano e ler “A Vida dos Animais” (1999), de J. M. Coetzee
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Sim, você se parece com a Elizabeth Costello quando fala.
Carola de pastoral da juventude e ler “Decamerão” (1351), de Boccaccio
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Nossa! Que livro… grosso…
Ateu de internet e ler “A Inocência do Padre Brown” (a partir de 1910), de Chesterton
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O incrédulo sacrílego vai ser obrigado a admitir que o bom padre
Brown derrota fácil Sherlock Holmes, Poirot, Dupin & companhia.
Fã de Chico Buarque e ler “Estorvo” (1991), de Chico Buarque
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Tudo bem, sem pânico, sempre tem o novo disco… ou os antigos.
Teórico da conspiração e ler “O Pêndulo de Foucault” (1988), de Umberto Eco
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