Breve perfil de brasileiros ilustres: o novo rei dos animais, por Sebastião Nunes

por Sebastião Nunes, GGN -

O rei Leão estava cochilando sossegadamente quando foi despertado por um barulhão esquisito.

– O que foi isso, Simão? Simão??? – alarmou-se o soberano, erguendo-se de um pulo e chamando a sentinela de plantão, o sempre prestativo macaco Simão.

Você apareceu? Nem Simão.

Quem apareceu foi Lobo das Neves seguido pelo inseparável comparsa Hiena Serrote, ambos portando trabucos de alto calibre. Atrás deles, igualmente armados com pesadas submetralhadoras, Urubu FHC, Coiote Franco, Raposa Maia, Sucuri Mendes, jararaca Lúcia, cascavel Toffoli, urutu Barroso e outros golpistas. Enrolado nas cortinas, Caxinguelê Alkmin, também conhecido como Caxinguelê Chuchu, tremia que nem vara verde. Ao lado dele, Vampiro Temer desdobrava as asas pontudas.

– Teje preso! – comandou Lobo das Neves.

– Perdeu, malandro! – secundou Hiena Serrote, imitando pivete.

Nosso amável rei Leão, depois de olhar em volta e verificar que estava sozinho, não teve remédio senão erguer as patas, rendendo-se.

O GOLPE DOS BICHOS

De mãos para cima, o rei Leão viu quando entrou Simão, empunhando trabuco dos mais possantes. Logo Simão, que até então só usara uma espada de madeira.

– Que é isso, Simão? – espantou-se o rei Leão. – Virou traíra?

– Sabe o que é, majestade? – respondeu Simão. – Eu ganhava, como sentinela, só um cacho de banana por semana. Aí chegou Urubu FHC como quem não quer nada, com aquela risadinha dele, e me ofereceu dois cachos de banana por semana.

– E você se vendeu por um cacho de banana?

– Veja o meu lado, majestade – ponderou Simão. – Imagine dividir um cacho de banana por semana com a Simone e o Simão Jr. Os coitados viviam varados de fome e andavam magros que nem cabo de vassoura.

Nisso entrou um batalhão de moscas-varejeiras, armadas com ferrões pontudos e fazendo um escarcéu dos diabos.

– Ah, vocês cooptaram as varejeiras também... – resmungou o rei Leão.

– Claro – e Lobo das Neves estufou o peito, orgulhoso. – Cooptamos não só as varejeiras como as lombrigas, as saúvas, os bichos-preguiça, as taturanas, as cigarras, as cobras venenosas, as lacraias, as amebas, os marimbondos e mais um mundão de bicho parasita e aproveitador. Se a gente não ganha no voto, ganha no tapetão, quero dizer, na mão grande, isto é, nos tribunais dos cupinchas.

FAZENDO ACORDOS POLÍTICOS

O rei Leão, sempre de mãos para cima, pensou no dia em que ganhou a eleição pela primeira vez. Lembrou que, para ganhar, teve de fazer uma costura nojenta com diversos bichos do centro e da direita. Dividiu cargos e ministérios. Tinha, às vezes, vontade de vomitar, mas aguentava firme.

Olhou para as mãos erguidas e murmurou:

– Foi uma merda. Não fiquei rendido como agora: fiquei de mãos amarradas.
Então teve uma ideia luminosa. Chamou Simão e sussurrou no seu ouvido:

– Volte para o meu lado que eu te pago quatro cachos de banana por semana.
Simão coçou a cabeça, balançou o rabo e acabou concordando.

– Tá bem. Aceito a oferta. O que tenho de fazer agora?

– Converse com os outros bichos. Ofereça a cada um o dobro do que esses bichos aí ofereceram. Exatamente o dobro!

Mais que depressa, Simão foi conversar com os bichos que, satisfeitos com o novo patamar dos ganhos, passaram a gritar em coro:

– Viva o rei Leão! Bicho bem nutrido jamais será vencido!

GOLPES E CONTRAGOLPES

Claro que os golpistas não se deram por derrotados e ofereceram aos bichos o dobro do que o rei Leão tinha oferecido.
Mais que depressa o rei Leão redobrou a oferta.
Que foi reredobrada pelos golpistas.
Que foi rereredobrada pelo rei Leão.
Que foi rerereredobrada pelos golpistas.
Que foi rereereredobrada pelo rei Leão.
Que foi rererereredobrada pelos golpistas. Etc.

ACORDANDO DO PESADELO

Foi quando acordei e me dei conta do absurdo da situação. Se fosse para fazer o jogo dos golpistas, o rei Leão não teria entrado nessa nova e infame disputa.
Por outro lado, seres humanos são corruptíveis, bichos não. Estes seguem velho princípio budista: comer quando se tem fome, beber quando se tem sede, dormir quanto se tem sono. Já entre os humanos, explica a História, sempre existem, escondidos e à espreita, os traíras, os corruptos, os oportunistas e os torturadores.

Acendi a luz e olhei para cima. Junto ao teto, Vampiro Temer voava de um lado para o outro dando cabeçada nas paredes.

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